13/07/2021

Trabalhador que recusa a vacinação pode ser dispensado por justa causa?

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A pandemia da COVID - 19 trouxe uma série de restrições à população e ao exercício de atividades econômicas, em âmbito global. É consenso da comunidade científica que apenas a vacinação de grande percentual da população mundial pode encerrar a propagação do vírus e trazer de volta à normalidade das atividades. Nesse contexto, o que já antes se afirmava sobre a vacinação não ser apenas um direito individual, mas um direito-dever coletivo, confirma-se ainda mais, pois, devido à rápida transmissibilidade da doença do coronavírus, é necessário que o maior número possível de indivíduos obtenha imunização por meio da vacinação. Mas no âmbito do meio ambiente do trabalho, caso o empregado se recusar a vacinação sem justificativa, o empregador poderá puni-lo com a justa causa? E mais, a vacinação é obrigatória ao trabalhador?

A Lei nº 13.979, de 6/2/2020, dispõe sobre as medidas para enfrentamento de emergência da saúde pública de importância internacional para o combate ao coronavírus, de forma que o espírito da lei foi criar uma política para combater a pandemia e proteger os interesses da coletividade. No seu artigo 3º, constam algumas medidas de saúde pública, em especial no seu inciso III, a determinação de realização compulsória da vacinação.

Nesse contexto surgiu o debate se as medidas de saúde pública, como a vacinação, seriam capazes de afrontar a vida privada, a intimidade, as convicções individuais, filosóficas e religiosas do trabalhador. Provocado a se manifestar sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal emitiu um juízo de valor a respeito da vacinação compulsória para o combate da Covid-19, qual seja, se seria ou não constitucional esta exigência, assim como se haveria ofensa à privacidade, a intimidade, a honra ou a dignidade do trabalhador. Na ocasião, o entendimento da Suprema Corte foi no sentido de que, inobstante a Constituição assegure a proteção aos direitos dos trabalhadores, dentre eles as suas concepções morais, espirituais e pessoais, o interesse coletivo supera as predileções individuais, ainda mais em se tratando de uma medida que tem o intuito de erradicar a doença. Se é verdade que nenhum direito pode ser considerado absoluto, de igual relevância é importante que ocorra a ponderação entre a liberdade individual consistente entre as optações particulares com os demais direitos e garantias constitucionais, tais como tutela a vida e a saúde.

Também o Ministério Público do Trabalho se manifestou quanto a temática, de sorte que, em janeiro de 2021, fora publicado um guia técnico interno sobre a vacinação da Covid-19, disciplinando no item II sobre a compulsoriedade da vacinação. Dentre as orientações do MPT consta que as empresas devem prever o risco biológico do SARS-CoV-2 no PPRA e a vacinação dentre as medidas a serem implementadas no PCMSO (NOTA TÉCNICA n. 20/2020  do GT COVID – 19 - https://mpt.mp.br/pgt/noticias/nota-tecnica-20-gt-covid-19-mptrevisao-11-12-2020-5.pdf ). O referido guia técnico, após referenciar a Lei nº 6.259/75, que dispõe sobre a organização das ações de vigilância epidemiológica e o programa nacional de imunização, além de citar a Lei nº 13.979/2020, delibera que "diante desse cenário legal e jurisprudencial, é de se concluir que a vacinação, conquanto seja um direito subjetivo dos cidadãos, é também um dever, tendo em vista o caráter transindividual desse direito e as interrelações que os cidadãos desenvolvem na vida em sociedade”.

Ressalta-se que a própria Consolidação das Leis do Trabalho preceitua que compete as empresas cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho, devendo adotar as medidas cabíveis. De igual modo, nos termos do artigo 158, inciso II, cabe ao empregado colaborar para seja efetivamente aplicada as normas de segurança e medicina do trabalho.

Dessa forma, persistindo a recusa injustificada à vacina, o trabalhador deverá ser afastado do ambiente de trabalho, sob pena de colocar em risco a imunização coletiva, e o empregador poderá aplicar sanções disciplinares, inclusive a despedida por justa causa com fundamento no artigo 482, h, combinado com art. 158, II, parágrafo único, alínea “a”, pois deve-se observar o interesse público, já que o valor maior a ser tutelado é a proteção da coletividade.

Note-se que, ao falarmos da recusa do trabalhador em tomar a vacina, e, portanto, apta a ensejar a justa causa, relaciona-se àquela feita de forma injustificada, pois, do contrário, comportando justo motivo, especialmente médico, parece óbvio que o caso demandaria uma atenção e cuidado especiais, sobretudo para se evitar qualquer tipo de arbitrariedade ou abuso de direito.

Portanto, se, porventura, o empregado não possuir uma justificativa médica para a recusa em tomar a vacina, e, considerando o dever do empregador em proteger o meio ambiente laboral, pode-se entender perfeitamente crível este se valer do seu poder diretivo para, neste caso, proceder com a dispensa do trabalhador por justa causa, dada a gravidade da situação enfrentada.

Alexandre Bastos, advogado trabalhista e sócio do escritório Atílio Dengo Advogados Associados.

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