A dedução dos materiais empregados na construção civil da base de cálculo do ISS é tema controverso, o qual sempre gerou posições antagônicas entre os fiscos municipais e os contribuintes, inclusive apresentando variações de posicionamento do próprio poder judiciário ao longo dos anos. Recentemente, através do julgamento do RE 603.497/MG, havido no âmbito do Plenário Virtual do STF, a Suprema Corte decidiu que a competência para efetivamente tratar sobre o tema do alcance da norma tributária relativa às deduções da base de cálculo do ISS no serviço de construção é do STJ, restando assim vigente o posicionamento atual daquela Corte, qual seja de que apenas os materiais produzidos fora do local da obra, pelo próprio prestador do serviço, é que podem ser excluídos da base de cálculo do imposto municipal.
Os tribunais superiores (STJ e STF) historicamente têm proferido decisões relativas à dedutibilidade dos materiais de construção da base de cálculo do ISS em serviços de construção. Todavia, estas decisões nem sempre foram uniformes, tão pouco categóricas, em definir o alcance das deduções da base de cálculo do ISS na construção civil. A Questão envolve não só a Lei Complementa 116/03, mas também o Decreto Lei 406/68 – diploma legal que tratava do ISS anteriormente à promulgação da Constituição Federal de 1988. Resumidamente, o STJ costuma adotar uma posição mais restritiva, entendendo que apenas alguns materiais poderiam ser deduzidos – mormente aqueles produzidos pelo próprio prestador do serviço. Por outro lado, o STF se manifestava sobre o tema quando instado a decidir sobre a constitucionalidade do Decreto Lei 406/68 – assim entendendo pela sua constitucionalidade e vigência, interpretando-o no sentido de que autorizava a dedução dos gastos com todos os materiais empregados na obra, independente se produzidos pelo prestador ou por ele adquiridos junto à terceiros. Em 2010, o RE 603.497/MG teve sua repercussão geral reconhecida (em outras palavras, o que fosse decidido neste recurso, a partir de agora, valeria para todos os demais casos análogos). Dessa forma, ao decidir o referido caso, o STF pôs fim, ao menos, à uma parte da controvérsia, asseverando que cabe ao STJ definir os alcances da norma de dedutibilidade referente à base de cálculo do ISS nos serviços de construção, bem como que sua posição atual, mais restritiva, não afronta a Constituição Federal.
Pois bem. Atualmente o STJ sustenta uma interpretação bastante restritiva sobre o tema. Fazendo uma análise sistêmica do DL 406/68 com a LC 116/03, constrói entendimento que somente os materiais produzidos pelo prestador de serviço fora do local da obra é que podem ser abatidos do ISS devido por ele, ficando os demais materiais como componentes do preço final do serviço. Ao realizar tal interpretação, o STJ está simplesmente fazendo uma delimitação dos campos de incidência do ICMS e do ISS, uma vez que aqueles materiais sobre os quais possibilita o “abatimento/exclusão” da base de cálculo do ISS são, na verdade, aquelas mercadorias sobre as quais a norma tributária prevê a prévia incidência do ICMS.
Conforme podemos verificar, esta decisão pouco favorável aos contribuintes não trata propriamente do direito de exclusão da base de cálculo do ISS dos materiais utilizados na obra (direito este garantido na legislação de regência do ISS). Na realidade, ela trata de uma simples delimitação dos campos de incidência entre o imposto estadual e o municipal, evitando que as mercadorias produzidas pelo próprio prestador, fora do local da obra, escapem à tributação pelo ICMS. Ao contribuinte, resta estar atento ao posicionamento atual da jurisprudência relativa ao tema, para evitar autuações por recolhimento incorreto ou cobranças indevidas, bem como para poder fazer planejamento, do ponto de vista negocial, a fim de reduzir seus custos com a prestação do serviço de construção civil.
Lucas Ferreira, advogado especialista em direito tributário e sócio do Escritório Atílio Dengo Advogados Associados