O ano recém iniciou, mas há regras tributárias que foram alteradas - entre os últimos dias do ano passado e os primeiros do atual - que modificaram significativamente à tributação do PIS e da COFINS. Analisaremos, sucintamente, cada uma delas:
I) Em 20/12/2022, foi publicada a Instrução Normativa RFB nº 2.121/22, consolidando as normas referentes à tributação do PIS e da COFINS. É sabido que as INs têm por objetivo apenas disciplinar a execução dos dispositivos legais sem, contudo, transpor ou criar regras em relação à norma que disciplina. Por outro lado, as Leis que tratam acerca da tributação do PIS (Lei nº 10.167/02) e da COFINS (Lei nº 10.833/03) – cominadas com as demais regras previstas no DL 1.598/77 - estabelecem a possibilidade de tomada de crédito sobre o “custo de aquisição” dos bens adquiridos para revenda ou utilizados como insumo.
Ocorre que a IN 2.121/22 – sem qualquer dispositivo legal que a autorizasse – criou uma hipótese de vedação à tomada dos créditos de entrada do PIS e da COFINS: excluiu do creditamento o valor do IPI incidente nas aquisições de bens. Além de extremamente gravosa aos contribuintes, essa previsão é ilegal.
O primeiro aspecto a ser observado é que qualquer regra que preveja majoração das contribuições sociais apenas pode se dar através de lei em sentido estrito (elaborado pelo Poder Legislativo, com a sanção do Executivo), diante do princípio constitucional da legalidade. Nesse ponto, à medida em que a vedação ao aproveitamento ocorreu através de instrução normativa – elaborada pelo Executivo – sua legalidade deve ser contestada. Além disso, a IN previu sua entrada em vigor a partir da data de sua publicação. Com isso, violou ainda outro princípio constitucional: o da anterioridade nonagesimal. A CF prevê que a regra que majora a tributação apenas deve produzir efeitos a partir de 90 dias de sua publicação.
II) Em 30/12/2022 – último dia útil do exercício anterior - foi publicado o Decreto nº 11.322 reduzindo as alíquotas do PIS e da COFINS incidentes sobre receitas financeiras, respectivamente, de 0,65% para 0,33% (PIS) e de 4% para 2% (COFINS). O decreto previu sua entrada em vigor em 1º de janeiro de 2023. No entanto, em 02/01/2023 – primeiro dia útil do ano - foi publicado o Decreto nº 11.374, revogando o de nº 11.322 e reestabelecendo as alíquotas anteriores (4%, para a COFINS; e, 0,65%, para o PIS). Além disso, o decreto ainda previu sua entrada em vigor na data de sua publicação. Assim, se deixou de respeitar a regra constitucional da anterioridade nonagesimal, segundo a qual a União é proibida de cobrar tributo antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que o aumentou.
III) Em 12/01/2023, foi publicada a MP nº 1.159/23 que criou uma hipótese legal de vedação ao crédito de PIS/COFINS, ao incluir no § 2º, do art. 3º, das Leis nº 10.167/02 e nº 10.833/03, a previsão de que “não dará direito a crédito o valor do ICMS que tenha incidido sobre a operação de aquisição”. Ocorre que esse dispositivo violou o princípio constitucional da não cumulatividade, à medida em que, como o PIS e a COFINS têm como regra matriz de incidência a receita auferida pelo contribuinte, a não cumulatividade das contribuições é alcançada por meio da concessão de crédito fiscal sobre as compras (custo e despesas), na mesma proporção da alíquota que grava as vendas (receitas). Dessa forma, é irrazoável vedar o direito de crédito sobre o valor do ICMS – incidente sobre o custo de aquisição.
Pois bem. Sabe-se que o objetivo fazendário tem sido reduzir os impactos econômicos decorrentes da decisão do STF que excluiu o ICMS da base de cálculo das contribuições: em 2019, quando do julgamento do Tema nº 69, a União estimou uma perda de arrecadação de aproximadamente R$ 50 bilhões por ano. Em contrapartida, as recentes modificações legislativas preveem um incremento de receita: a Fazenda estima - apenas com a regra que veda os créditos de PIS/COFINS sobre o valor do ICMS nas aquisições - um aumento de arrecadação de R$ 30 bilhões/ano. Ocorre que, as recentes alterações legislativas violaram garantias constitucionais dos contribuintes, já sendo possível prever, em janeiro, que haverá uma tendência à judicialização de temas tributários no presente ano.
Rafael Lacerda Paiani, advogado, especialista em direito tributário e sócio do escritório Atílio Dengo Advogados.