O PAT (Programa de Alimentação do Trabalhador) foi instituído no ano de 1976, com a finalidade de estimular as empresas a fornecerem melhores condições de trabalho a seus empregados, tendo em contrapartida o benefício fiscal consubstanciado na dedução no IRPJ do dobro das despesas incorridas com a alimentação dos funcionários, limitado ao percentual de 5% do lucro, para as empresas inscritas no programa. Entretanto, em 2021, o Governo Federal editou o Decreto n° n° 10.854, através do qual impôs significativas restrições às deduções permitidas no bojo do programa (conforme abordamos neste espaço, em artigo de 2022 –https://atiliodengo.com.br/artigos-tributarios/182/poder-executivo-restringe-o-beneficio-fiscal-atrelado-ao-pat). Neste breve artigo, trataremos das normas vigentes atualmente em relação ao PAT e da posição do Poder Judiciário sobre o tema.
Historicamente ao longo dos anos, o Poder Executivo buscou, em diversas oportunidades, mitigar a extensão do benefício original atrelado ao PAT, através de atos infralegais regulatórios que na prática modificavam, em algum grau, a regra original contida na lei que criou o programa. Via de regra, todavia, em função de contestações judiciais dos contribuintes e atos normativos posteriores, as normas originais acabavam sendo reestabelecidas. Até 2021, o tema era regulado pelo Decreto nº 9.580/2018, o qual mantinha a regra da dedução em dobro, limitada ao percentual de 5% do lucro da empresa. Entretanto, em outubro de 2021, o Governo Federal editou o Decreto n° 10.854, atualmente vigente, através do qual estabeleceu significativas restrições ao direito de dedutibilidade das despesas do PAT, quais sejam: i) a dedução é possível apenas em relação aos valores gastos pela empresa com trabalhadores que recebam até cinco salários mínimos, sendo extensível aos demais (que ganham além disso) somente quando haja serviço próprio de refeições ou de distribuição de alimentos por meio de entidades fornecedoras de alimentação coletiva e ii) a dedução é possível apenas em relação à parcela do benefício de alimentação fornecido ao trabalhador, que corresponder ao valor de, no máximo, um salário-mínimo. Estas novas regras não encontram amparo na lei de regência do PAT. Muito mais do que mera modificação na regulamentação e sistemática de apuração do benefício fiscal relativo ao IRPJ, ligado ao PAT, este novo decreto importa em verdadeira inovação das regras do benefício, acarretando uma efetiva majoração da carga tributária às empresas participantes do programa. Todavia, nosso sistema jurídico não admite este tipo de alteração, na forma pela qual foi promovida.
Ao dispor nestes termos, o conteúdo do Decreto n° 10.854/2021 extrapola o limite de competência dos atos infralegais. Isto porque a principal função do decreto é a de regulamentar a lei, ou seja, descer às minúcias necessárias de pontos específicos, criando os meios necessários para fiel execução da lei, sem, contudo, contrariar qualquer das disposições dela ou inovar - como já havíamos avaliado neste espaço, no artigo de 2022. Justamente neste sentido foi o recente entendimento exarado pelo STJ ao apreciar a matéria, no final de 2023. No julgamento do REsp 2.088.361, a Segunda Turma daquela Corte Superior confirmou o entendimento que já vinha sendo adotado pelos tribunais inferiores, entendendo que o Decreto n° 10.854/2021 incorreu em ilegalidade, eis que ato infralegal (neste caso, decreto), não pode restringir, ampliar ou alterar direitos decorrentes de lei.
Apesar deste julgamento não ter sido proferido em sede de Recurso Repetitivo, o que tornaria automaticamente procedente para o contribuinte/autor todas as ações judiciais já ajuizadas ou vindouras sobre o tema, a referida decisão importa em significante precedente. Agora, mais do que nunca, o ingresso de demanda judicial com objetivo de afastar as novas restrições ao PAT revela-se importante ação a ser manejada pelas empresas contribuintes, em especial aquelas que possuem grande número de funcionários, pois o benefício econômico que podem obter é de grande relevância.
Lucas Ferreira, advogado especialista em Direito Tributário e sócio do escritório Atílio Dengo Advogados