11/06/2019

A ilegalidade da responsabilização dos sócios por pedido de compensação negado pela SRFB

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A Instrução Normativa da Receita Federal (INRFB) n° 1862/18, publicada em dezembro de 2018, trata da imputação de responsabilidade tributária, ainda no momento da constituição do crédito fiscal. Acontece que algumas das normas contidas nesta INRFB são contrárias à Constituição Federal, bem como ao Código Tributário Nacional. Dentre estas normas, a que mais chama a atenção é aquela que, aparentemente, permite à Secretaria da Receita Federal (SRFB) o redirecionamento do débito da empresa aos seus sócios gerentes no momento do despacho administrativo que indefere pedido de compensação – sem prejuízo na aplicação da multa isolada de 50%, que por si só já é matéria controversa.  

Ao longo dos últimos anos, a legislação nacional vem criando mecanismos com o objetivo de desestimular, e até mesmo penalizar, o regime de compensação. Sob o fundamento de que muitas vezes os contribuintes se valem deste expediente administrativo apenas para obter CND, ou para tentar que a homologação da compensação de créditos inexistentes ocorra pelo decurso do prazo sem a apreciação da SRFB, passou-se a prever a incidência de multas nos casos de indeferimento do pedido de compensação. Em 2014, criou-se a figura da multa isolada de 50%, aplicada sobre os débitos que se procurou compensar. A constitucionalidade desta multa vem sendo discutida, e hoje encontra-se no STF, sob a sistemática da repercussão geral. Pois bem, até o advento da INRFB n° 1862/18, esta era a maior penalidade que o contribuinte poderia enfrentar ao ter um pedido de compensação indeferido. 

Agora, a referida INRFB permite, em tese, que além da aplicação desta multa, o Fisco redirecione o débito para a pessoa do sócio da empresa se, por algum motivo natural ao regime de compensação (como por exemplo a tentativa de compensação de débitos já inscritos em Dívida Ativa ou de débitos já consolidados em sede de algum parcelamento), a declaração de compensação for negada e a multa em questão, aplicada. Ao que nos parece, o que a RFB está fazendo é “legislar em causa própria”, criando nova hipótese de responsabilização tributária - algo que só é possível ser feito por meio de lei.

A responsabilização de terceiros pelo débito tributário está disciplinada no CTN – art. 134 e 135. Esta Lei determina que só é possível o redirecionamento da obrigação tributária aos sócios, com poderes de representação e gerência, caso se verifique a ocorrência de algum ato doloso praticado com excesso de poder, infração à lei ou ao estatuto/contrato social da empresa. Em outras palavras, é necessário a ocorrência de um ato contrário à lei, para que os sócios possam ser responsabilizados por débitos tributários originalmente de responsabilidade da empresa. O mero inadimplemento do débito fiscal pela sociedade não gera, por si só, a responsabilização dos sócios.  Além do mais, por tratar-se de matéria sensível, a Constituição Federal reserva à lei o tema da responsabilização tributária – art. 150, §7º.    

Dessa forma, a ilegalidade e a inconstitucionalidade da INRFB n° 1862/18 parecem evidentes.  Ainda que na prática não se tenha notícias da utilização desta responsabilização por parte da SRFB, as primeiras decisões judiciais que proíbem a sua aplicação já começam a aparecer. As decisões têm sido proferidas em Mandados de Segurança preventivos – ações mandamentais que os contribuintes vêm ingressando concomitantemente ao pedido de compensação, a fim de evitar a responsabilização dos sócios, e até mesmo a aplicação da multa isolada, em caso de indeferimento dos PER/DECOMP. 

Lucas Ferreira, advogado especialista em Direito Tributário e sócio do escritório Atílio Dengo Advogados

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