Atílio Dengo Advogados Associados

Reforma Tributária: Os problemas do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS)

01/10/2019

Noutra oportunidade (artigo publicado no JC em 10/7), apresentamos uma análise ampla das propostas de reforma tributária que estão tramitando no Congresso Nacional. No presente texto vamos nos deter ao novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) apresentado em ambas as propostas de Emenda Constitucional, a PEC 45 e a PEC 110.

As duas propostas extinguem cinco tributos (IPI, ICMS, ISS, PIS, COFINS) que serão substituídos por um imposto sobre o consumo. O novo imposto será arrecadado conjuntamente, pela União, pelos Estados e pelos Municípios e incidirá sobre operações com mercadorias; prestação de serviços; locação ou cessão de bens e direitos; inclusive bens intangíveis. O IBS terá regras uniformes em todo o território nacional que serão aprovadas pelo congresso Nacional por meio de lei complementar.

Essa uniformidade é o que há de melhor nas propostas apresentadas até agora, com ela o sistema se tornará mais simples e fácil de cumprir. No entanto é preciso ter cuidado. Não se deve resolver um problema criando outros. Em nome da simplificação das regras tributarias, não se pode fechar os olhos para as diferentes realidades econômicas e sociais existentes no País. Se isso acontecer passaremos a contar com um novo sistema tributário simples, porém desarmônico e em condições de produzir estagnação econômica. Isso pode ocorrer porque tanto a PEC 45, quanto a PEC 110 possuem um grave defeito: elas são excessivamente rígidas em relação as alíquotas do IBS.

A PEC 45 adota uma única alíquota, formada pela soma das alíquotas instituídas pela União, pelos Estados ou Distrito Federal e pelos Municípios. Essa alíquota única, por assim dizer, incidirá sobre todas os fatos alcançados pelo IBS. Noutras palavras, tanto a compra de um automóvel, quanto a prestação de um serviço serão tributadas com a mesma alíquota do imposto.

Quanto a PEC 110, a arrecadação também será compartilhada entre União, Estados e Municípios, mas ela é um pouco mais flexível pois permite a criação de alíquotas máximas e mínimas. O problema é que a proposta não estabelece os critérios de aplicação de uma ou outra alíquota. A PEC 110 transfere essa escolha para o legislador infraconstitucional e essa não é a melhor prática. Vemos um exemplo disso na LC 87, nas sucessivas postergações da regulamentação de direitos dos contribuintes do ICMS. A falta de maior flexibilidade nas alíquotas do IBS repercute negativamente aumentando a carga tributária. Vejo aqui dois problemas imediatos:

O primeiro é o aumento da carga tributária sobre determinados itens de consumo, por exemplo, os serviços, que antes eram tributados pela União e pelos Municípios, serão agora tributados pelos três entes da federação. O mesmo ocorrerá com as mercadorias, antes tributadas pela União e pelos Estados.

O segundo problema diz respeito à tributação dos gêneros de primeira necessidade. Como vimos a PEC 45 ignora isso, propondo uma alíquota única. Enquanto a PEC 110 prevê a criação de alíquotas máximas e mínimas mas transfere para o legislador infraconstitucional a tarefa de instituir tratamento diferenciado para alimentos, inclusive os destinados ao consumo animal; medicamentos; transporte público coletivo de passageiros urbano; bens do ativo imobilizado; saneamento básico; educação infantil, ensino fundamental, médio e superior e educação profissional. No entanto, a proposta não assegura o direito ao tratamento diferenciado.

Atualmente a CF/88 contem regras prevendo a seletividade das alíquotas do IPI e do ICMS. Isso é extremamente importante por razões jurídicas e econômicas. Em termos jurídicos, a existência de alíquota seletivas, isto é, menores para os produtos que são essências para a vida da maioria da população, é uma das maneiras de garantir o acesso de todos os brasileiros ao mínimo necessário para uma existência digna, a dignidade da pessoa humana é um princípio fundamental da Constituição Federal. Além disso, há motivos econômicos que justificam a adoção de alíquotas seletivas: se os gêneros de primeira necessidade forem tributados com a mesma alíquota aplicável aos gêneros dispensáveis ou supérfluos, o custo de vida aumentará pressionando a necessidade de aumento do salário mínimo.

Por Atílio Dengo, advogado, doutor em Direito Tributário, professor universitário e sócio do escritório Atílio Dengo Advogados Associados.

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